Os cuidados de saúde prestados não são iguais em todo o território nacional. Em Portugal, os pacientes com enfarte agudo do miocárdio que dão entrada num hospital de Lisboa, Alentejo ou Algarve tem um maior risco de mortalidade do que os que são tratados numa unidade hospitalar do Norte do país. Os resultados são de um estudo desenvolvido no CINTESIS – Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde, pela investigadora Mariana Lobo.

“Um sistema de saúde deve prestar cuidados de saúde de elevada qualidade independentemente do hospital em que os pacientes sejam tratados, assumindo que tudo o resto é igual”, defende Mariana Lobo.

Com o objetivo de avaliar se esta premissa se cumpre no que respeita à doença coronária, a investigadora estudou “as variações entre hospitais na mortalidade intra-hospitalar e readmissão urgentes ocorridas até 30 dias após a alta, de pacientes com enfarte agudo do miocárdio, entre os anos de 2012 e 2015”. No total, foram analisados mais de 38 mil registos de internamento, em 37 centros hospitalares. Os dados foram obtidos através da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) e incluíam os registos de todos os hospitais de Portugal Continental, devidamente anonimizados.

A maioria dos pacientes é do sexo masculino e apresenta uma média de idades de 69 anos. Entre as doenças que coexistiam com o quadro de enfarte destacam-se a aterosclerose (acumulação de gordura nas artérias), com uma taxa de 67%, e a diabetes, com 35%.

8% da variabilidade total na mortalidade intra-hospitalar por enfarte agudo do miocárdio deve-se às diferenças entre hospitais. É expectável que hospitais que recebam pacientes com a doença mais agudizada e/ou com mais comorbilidades verifiquem taxas de mortalidade mais elevadas. Contudo, as características basais dos pacientes não explicaram toda a variabilidade existente entre hospitais. Aliás, os dados revelam que a probabilidade de um paciente com enfarte morrer é duas vezes maior se for tratado num hospital de alto risco, do que se for tratado num hospital de médio/baixo risco.

“Os nossos resultados confirmaram que o hospital representa um efeito contextual – alguns hospitais têm desempenhos consistentemente melhores do que outros hospitais. Além disso, entre as características hospitalares examinadas, verificou-se que o número de casos de enfarte tratados e o tamanho do hospital estavam associados com taxas de mortalidade e readmissão mais baixas”. Ou seja: os cuidados saúde prestados a doentes coronários tendem a ser melhores, quantos mais casos de enfarte forem tratados anualmente no hospital e quanto menores sejam os hospitais.

A localização geográfica do hospital também exibiu uma relação com a qualidade dos cuidados prestados, tendo um paciente com enfarte agudo do miocárdio hospitalizado nas regiões do Alentejo/Algarve ou Lisboa um risco de morte intra-hospitalar mais de 30% quando comparado com um paciente tratado na região Norte”.

Mariana Lobo, realça, por isso, que as políticas de saúde poderiam ser dirigidas a hospitais específicos, dependendo do seu nível de risco, devendo ser dada especial atenção ao número de casos de enfarte praticados por hospital e às práticas hospitalares em diferentes regiões geográficas. “É preciso desenhar estratégias dirigidas para os hospitais com fraco desempenhado, de forma a reduzir as desigualdades existentes na qualidade dos serviços de saúde prestados no Norte e no Sul do país”, conclui.

Desenvolvido no CINTESIS, o estudo integra a tese de doutoramento da investigadora, defendida na Faculdade de Medicina da U.Porto (FMUP), no âmbito do Programa Doutoral em Investigação Clínica e Serviços de Saúde (PDICSS), sob a orientação de Armando Teixeira-Pinto (da Universidade de Sydney) e Sharon-Lise Normand (da Harvard Medical School).